A música, para a maioria de nós, é uma parte significativa e em geral agradável da vida. Não falo só da música externa, a que ouvimos com nossos ouvidos, mas também da música interna, a que toca na nossa cabeça. Quando Galton escreveu sobre "imagens mentais" na década de 1880, referiu-se apenas a imagens visuais, e de modo nenhum a imagens musicais. Mas se fizermos um levantamento entre nossos amigos poderemos perceber que as imagens mentais musicais apresentam-se em uma gama tao variada quanto as visuais. Há pessoas que mal conseguem manter uma melodia na cabeça, enquanto outras podem ouvir sinfonias inteiras na mente, quase tão detalhadas e vívidas quanto as ouvidas por meio da percepção real.
Eu me dei conta dessa imensa variação ainda criança, pois meus pais situavam-se nos extremos opostos do espectro. Minha mãe tinha dificuldade para imaginar voluntariamente qualquer melodia, enquanto meu pai parecia possuir uma orquestra inteira dentro da cabeça, pronta para tocar o que ele mandasse. Ele sempre trazia no bolso duas ou três minipartituras orquestrais, e entre um e outro paciente às vezes ele pegava uma das partituras e executava um concerto interno. Não precisa pôr o disco no gramofone, pois era capaz de tocar mentalmente uma partitura quase com a mesma vividez, talvez em diferentes modos ou interpretações, e ocasionamente com uma improvisação de sua autoria. Sua leitura de cabeceira favorita era um dicionário de temas musicais. Ele folheava algumas páginas, quase ao acaso, saboreando isto ou aquilo, e então, estimulado pela abertura de alguma composição, decidia-se por uma sinfonia ou concerto favorito, a sua própria kleine Nachtmusik (pequena serenata), como ele dizia.
Desde meados dos anos 1990, estudos realizados por Robert Zatorre e seus colegas usando avançadas técnicas de neuroimagem demonstraram que, de fato, imaginar música pode ativar o córtex auditivo quase com a mesma intensidade da ativação causada por ouvir música. Imaginar música também estimula o córtex moor, e, inversamente, imaginar a ação de tocar música estimula o córtex auditivo. Isso, observaram Zatorre e Halpern em um ensaio de 2005, "corresponde às afirmações de músicos de que são capazes de 'ouvir' seu instrumento durante a prática mental."
A espectativa e a sugestão podem intensificar notavelmente a imaginação musical e até produzir uma experiência quase perceptual. Jerome Bruner, um amigo meu extremamente musical, contou-me que certa vez pôs um de seus discos favoritos de Mozart para tocar, ouviu-o com grande prazer e então foi virar o disco para ouvir o outro lado. Descobriu, naquele momento, que não tinha posto o disco para tocar da primeira vez. Talvez esse seja um exemplo extremo de algo que acontece às vezes com todos nós com músicas bem conhecidas: pensamos estar ouvindo a música baixinho no rádio, mas ele foi desligado ou a música já acabou, e ficamos em dúvida se ela ainda continua a tocar ou se estamos simplesmente a imaginá-la.
Eu me dei conta dessa imensa variação ainda criança, pois meus pais situavam-se nos extremos opostos do espectro. Minha mãe tinha dificuldade para imaginar voluntariamente qualquer melodia, enquanto meu pai parecia possuir uma orquestra inteira dentro da cabeça, pronta para tocar o que ele mandasse. Ele sempre trazia no bolso duas ou três minipartituras orquestrais, e entre um e outro paciente às vezes ele pegava uma das partituras e executava um concerto interno. Não precisa pôr o disco no gramofone, pois era capaz de tocar mentalmente uma partitura quase com a mesma vividez, talvez em diferentes modos ou interpretações, e ocasionamente com uma improvisação de sua autoria. Sua leitura de cabeceira favorita era um dicionário de temas musicais. Ele folheava algumas páginas, quase ao acaso, saboreando isto ou aquilo, e então, estimulado pela abertura de alguma composição, decidia-se por uma sinfonia ou concerto favorito, a sua própria kleine Nachtmusik (pequena serenata), como ele dizia.
Desde meados dos anos 1990, estudos realizados por Robert Zatorre e seus colegas usando avançadas técnicas de neuroimagem demonstraram que, de fato, imaginar música pode ativar o córtex auditivo quase com a mesma intensidade da ativação causada por ouvir música. Imaginar música também estimula o córtex moor, e, inversamente, imaginar a ação de tocar música estimula o córtex auditivo. Isso, observaram Zatorre e Halpern em um ensaio de 2005, "corresponde às afirmações de músicos de que são capazes de 'ouvir' seu instrumento durante a prática mental."
A espectativa e a sugestão podem intensificar notavelmente a imaginação musical e até produzir uma experiência quase perceptual. Jerome Bruner, um amigo meu extremamente musical, contou-me que certa vez pôs um de seus discos favoritos de Mozart para tocar, ouviu-o com grande prazer e então foi virar o disco para ouvir o outro lado. Descobriu, naquele momento, que não tinha posto o disco para tocar da primeira vez. Talvez esse seja um exemplo extremo de algo que acontece às vezes com todos nós com músicas bem conhecidas: pensamos estar ouvindo a música baixinho no rádio, mas ele foi desligado ou a música já acabou, e ficamos em dúvida se ela ainda continua a tocar ou se estamos simplesmente a imaginá-la.
Oliver Sacks, Alucinações musicais, páginas 41; 42; 43.
Um comentário:
Sensacional. Me lembra duas coisas isso: As músicas dos jogos de video-games que, depois de muito tempo jogando, não me deixavam dormir; e a expressão de espanto do meu pai, toda vez que eu adianto uma música pela primeira nota ou ruído da gravação.
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